3 de set de 2024 às 14:51
Como católico que vive na Indonésia, maior país muçulmano do mundo, Baso Darmawan não pensa duas vezes antes de fazer o sinal da cruz antes de uma refeição num restaurante na movimentada capital Jacarta.
Darmawan diz conhecer pessoalmente muitos indonésios que se converteram do islamismo ao catolicismo, incluindo seu próprio pai. Ele disse à CNA, agência em inglês da EWTN News, que viver ao lado de seus vizinhos muçulmanos em Bogor, Indonésia, também pode ser um lembrete diário de fé.
“Como os muçulmanos rezam cinco vezes ao dia, às vezes eu uso o chamado para a oração deles como lembrete para rezar o Ângelus ou o Ofício das Horas, porque o horário é semelhante ao nosso horário de oração”, disse Darmawan.
A Indonésia, quarto país mais populoso do mundo, tem mais muçulmanos do que qualquer outro país. Cerca de 87% dos 275 milhões de habitantes do país são muçulmanos. Os 29 milhões de cristãos também estão espalhados pelas 17 mil ilhas do vasto arquipélago que forma o país.
Mas a Indonésia enfrenta desafios à sua imagem de tolerância com a ascensão de grupos islâmicos linha-dura nos últimos anos. Esses grupos às vezes entram em choque com vozes muçulmanas mais moderadas e minorias religiosas.
Apesar desses incidentes, vários esforços foram feitos para promover o entendimento inter-religioso na Indonésia. Paul Hedges, professor de estudos inter-religiosos na Nanyang Technological University de Singapura, diz: “Em termos gerais, nas últimas décadas, as relações católico-muçulmanas ou cristãs-muçulmanas em geral têm sido muito boas na Indonésia.”
“É um lugar de uma forma muito moderada e inclusiva de islamismo, e é algo que o governo realmente quer enfatizar bastante”.
“Se você perder sua coesão social, começa a ter mais tensões, e isso afeta tanto as condições econômicas no local quanto muito do investimento, fazendo com que as pessoas se tornem menos dispostas a vir e investir lá”, diz Hedges.
Em Jacarta, de 3 a 6 de setembro, o papa visitará a catedral e a mesquita de Istiqlal, onde participará de um encontro inter-religioso com representantes das seis religiões oficialmente reconhecidas na Indonésia: islamismo, budismo, confucionismo, hinduísmo, catolicismo e protestantismo.
O grande imã Nasaruddin Umar da mesquita de Istiqlal disse à EWTN News que muitos muçulmanos na Indonésia estão muito felizes que o papa visitará seu país “porque o papa é uma das pessoas mais importantes do mundo hoje”.
Antes da viagem do papa, o imã Umar propôs a criação de um “Túnel da Amizade” subterrâneo, que conecta fisicamente a catedral e a mesquita, para simbolizar a harmonia entre as duas religiões.
O papa Francisco visitará o túnel com o grande imã antes de ambos assinarem uma declaração conjunta, que Umar diz abordar “questões humanitárias, de tolerância e ambientais” na visita do papa à mesquita em 5 de setembro.
O xeque Yahya Cholil Staquf, presidente geral da Nahdlatul Ulama, maior organização muçulmana independente do mundo, recebeu a visita do papa Francisco com uma mensagem: “Aproveite o país da unidade, o país da tolerância e da fraternidade”.
Receba as principais de ACI Digital por WhatsApp e Telegram
Está cada vez mais difícil ver notícias católicas nas redes sociais. Inscreva-se hoje mesmo em nossos canais gratuitos:
Assine aqui a nossa newsletter diária
O movimento Nahdlatul Ulama, sediado na Indonésia, clama por um “islamismo humanitário” reformado e desenvolveu uma estrutura teológica para o islamismo que rejeita os conceitos de califado, lei Sharia e “kafir” (infiéis).
Staquf disse à CNA em 2019 que ficou “emocionado e entusiasmado” quando o papa Francisco e o grande imã de al-Azhar Ahmed el-Tayeb assinaram a declaração de Abu Dhabi sobre “Fraternidade Humana pela Paz Mundial e Convivência Comum”, porque ela expressa a visão do “islã compassivo” que sua organização defende há décadas.
A experiência de tolerância religiosa na Indonésia não é apenas teórica, mas vivida em interações cotidianas. A irmã Martha Driscoll, madre superiora fundadora do monastério de Gedonof na ilha de Java, disse que sua comunidade trapista vive em paz e amizade com os muçulmanos locais.
“Todos os nossos trabalhadores são muçulmanos, e temos irmãs que eram de famílias muçulmanas que se converteram ao catolicismo. As famílias delas vinham nos visitar, e não havia problema algum”, disse ela.
A irmã disse que também tinha “filhos espirituais muçulmanos, que ainda são muçulmanos, mas vêm ao mosteiro. Eles ficam profundamente comovidos quando falo de perdão, algo que falta na prática muçulmana normal. Várias figuras muçulmanas vieram apenas para rezar e passar a noite. Não para ter discussões formais — apenas para serem amigos”.
“Esse é um lado da vida muçulmana que muitas pessoas no Ocidente não percebem”, disse ela ao acrescentar que os muçulmanos na Indonésia podem mostrar ao mundo como é viver em harmonia com uma minoria.
Apesar de serem uma minoria, os católicos na Indonésia — que somam cerca de 8,3 milhões, segundo as últimas estatísticas da Santa Sé — desempenham um papel ativo na vida social, religiosa e cultural do país.
Nugroho descreveu a Igreja na Indonésia como “bastante forte” nas questões sociais do país, ao ficar do lado dos pobres, defender os direitos humanos e dar uma “voz moral” às questões enfrentadas pelo país.
O padre Thomas Ulun Ismoyo, vice-secretário da arquidiocese de Jacarta e porta-voz do comitê de visita papal, disse: “Os católicos são apenas 3% da população total. Mas não nos sentimos inferiores aos números. Qualidade é mais importante do que quantidade.”
“Se você vier visitar as igrejas católicas da Indonésia no domingo, a igreja estará lotada. As pessoas estão vindo à igreja não apenas no domingo”, disse ele, mas também estão muito envolvidas em atividades religiosas em suas paróquias.
A Indonésia também produz muitas vocações. O seminário Maior de São Pedro na ilha de Flores é considerado um dos maiores seminários católicos do mundo em matrículas. Segundo a Santa Sé, o país tem 4.024 seminaristas e 3.945 alunos de seminários menores.
Para muitos católicos indonésios, a visita do papa Francisco representa um momento de reforço espiritual. Darmawan acredita que a presença do papa em seu país será “uma bênção para a Indonésia”.
“Acredito que para os católicos na Indonésia, a visita do papa está, de certa forma, fortalecendo não apenas a fé, mas também a unidade”, disse Nugroho.