Quatro bispos africanos participaram na Assembleia Plenária dos Bispos de França, que se realizou em Lourdes de 5 a 10 de novembro. Entre eles, Gabriel Sayaogo, arcebispo de Koupéla, no Burkina Faso. A sua intervenção, no dia 5 de novembro, centrou-se nos desafios que enfrentam os sacerdotes africanos enviados como fidei donum para a Europa. Um dos principais problemas é o fosso cultural entre os dois continentes. O prelado propôs a criação de um quadro para a preparação pastoral destes futuros.
Stanislas Kambashi, SJ et Fabrice Bagendekere, SJ – Cidade do vaticano
A Conferência Episcopal Francesa realizou a sua assembleia plenária ordinária em Lourdes. A reunião, que aconteceu nos dias 5 a 10 de novembro, exigiu a presença de vários bispos africanos, tendo em conta os temas propostos para discussão na reunião. Entre eles, a questão dos padres africanos em missão na Europa. Os prelados africanos foram convidados a contribuir, através das suas reflexões e propostas, para uma melhor integração destes sacerdotes africanos que exercem o seu ministério na Europa.
Esta questão foi abordada por D. Gabriel Sayaogo, Arcebispo de Koupéla, Burkina Faso, e Co-Presidente Sul da Fundação Internacional Religiões e Sociedades (Missão e Educação). Esta Fundação, criada em 2017, tem como objetivo refletir sobre a educação católica em África, mas também ver como acompanhar os padres africanos que vêm em missão para a Europa. Numa entrevista à Rádio Vaticano – Vatican News, o prelado do Burkina Faso falou sobre os desafios que estes missionários enfrentam nos seus novos locais de missão.
Um obstáculo importante: o fosso cultural entre a África e a Europa
Um dos elementos criticados pelos africanos na evangelização do seu continente é o facto de os missionários, vindos sobretudo do Ocidente, “não terem tido muito em conta as culturas africanas”. Foi a partir desta amarga constatação que nasceu o movimento e o conceito de inculturação, disse o Bispo Sayaogo. O objetivo é reavivar o ser social africano fundamental, que tinha sido rejeitado com o pretexto de “cristianismo sem feitiço”. O mesmo desafio espera hoje os padres africanos, que são chamados a manifestar “a circularidade dos dons e das graças de Deus na sua Igreja”, trabalhando nas Igrejas irmãs da Europa. O risco é “impor-se a si próprio ou, pelo menos, impor uma cultura que conhece bem, uma cultura em que nasceu, uma cultura em que cresceu e, naturalmente, rejeitar a cultura que o acolhe”, diz o arcebispo de Koupéla.
É preciso, portanto, encontrar uma forma de “conciliar estas duas culturas para que um padre, bem imbuído da sua cultura africana, consiga entrar em contacto com a cultura europeia e, assim, ser eficaz na sua missão”, diz o prelado burquinense. Para isso, encoraja todas as dioceses que acolhem estes padres missionários a criarem programas de integração, como acontece em algumas Igrejas, nomeadamente em França. Segundo D. Sayaogo, isso permitirá aos novos missionários saber “o que a população de acolhimento espera deles e o que eles próprios estão em condições de dar”.
Um “certo conforto” perdido
De acordo com o copresidente sul da International Religions and Societies Foundation, os padres em África vivem com “um certo conforto”, o que significa que os ministros ordenados têm à sua disposição um mínimo de serviços para satisfazer algumas das suas necessidades. “Em África, o padre não cozinha para si próprio, há um serviço que lhe fornece a roupa lavada, já tem uma casa para viver, um teto e depois, claro, o escritório”. Não é o caso da Europa, diz o arcebispo de Koupéla. “Tem de comprar comida, não tem quem lhe lave a roupa (…), vive do seu salário. Se está doente, é com esse salário que tem de ser tratado. É desse salário que ele tem de viajar para fazer a missão…”. Esta discrepância pode ser um obstáculo ao desenvolvimento do padre e ao bom desempenho da sua missão, afirma o prelado.
Uma colheita árida
Outro desafio que os padres africanos deslocados para a Europa enfrentam é a falta de cristãos nas igrejas. Em África, as igrejas continuam cheias e os fiéis aproximam-se facilmente dos seus pastores. “Quando abre o escritório, por vezes o padre não tem tempo para pensar nas horas das refeições ou das orações. Quando quer celebrar, onde quer que esteja, quer seja numa aldeia ou na cidade principal, as suas igrejas estão sempre cheias”, diz o Bispo Sayaogo. Já não é assim na Europa, onde, mesmo aos domingos, a assistência à missa é modesta. Para o prelado do Burkina Faso, este facto provoca desorientação.
Esta situação pode levar a perguntas como “O que é que eu vim fazer aqui?”, sublinha o bispo, considerando que continua a ser necessária uma presença sacerdotal mais forte em certas zonas rurais africanas, onde os cristãos são obrigados a percorrer dezenas de quilómetros para participar na Eucaristia. Isto, e tudo o resto, exige uma mudança de mentalidade, sem a qual não é possível a plena integração do padre, declara. Daí a necessidade, segundo o prelado, de unir esforços para poder “adquirir estruturas onde os padres possam ser formados antes de serem enviados em missão”. Trata-se de criar um instituto pastoral que ofereça um curso preparatório intelectual, social e missionário”, sublinhou o Co-Presidente Sul da Fundação Internacional das Religiões e Sociedades.
A necessidade de regular a programação do fenómeno fidei donum
Fidei donum, que em latim significa “o dom da fé”, é o título da encíclica publicada pelo Papa Pio XII a 21 de abril de 1957. Neste documento magisterial, “o Papa pedia aos bispos que autorizassem os seus sacerdotes diocesanos a responder aos apelos para as missões ultramarinas, particularmente em África e na América Latina, embora permanecendo ligados à sua diocese de origem e mesmo que isso implicasse o seu regresso após vários anos”. Devido ao declínio das vocações nalguns países ocidentais, os bispos apelam agora a sacerdotes Fidei donum, particularmente de África e da América.
Há várias maneiras de os padres chegarem à Europa, observou o Bispo Sayaogo. “Alguns chegam à Europa através de um acordo devidamente assinado por dois bispos. Há aqueles que estão aqui porque os seus bispos os enviaram para estudar (…). Há também aqueles que, depois de se terem entregue ao trabalho pastoral em África, tendo problemas de saúde, com o acordo dos seus bispos, vêm para a Europa porque as instalações sanitárias são melhores”. Lamenta também o facto de os padres irem por vezes parar a países europeus sem o acordo do seu bispo.
Além disso, há padres que vieram para estudar e que têm relutância em regressar à sua diocese, apesar de “o bispo o ter enviado, contando que ele desempenhe algum tipo de ministério no seu país”. Segundo o bispo burquinense, isto dá a impressão de que o número de padres está a transbordar “para o sul”, enquanto se cria um vazio na programação diocesana. Perante todas estas irregularidades, D. Sayaogo pede que se chegue a um acordo prévio entre os bispos antes de se comprometer com um padre estrangeiro.
Após o Sínodo, quatro bispos africanos foram convidados pelos seus homólogos franceses para debater o Pacto Educativo Africano, inspirado no Pacto Educativo Global do Papa Francisco. Trata-se do Cardeal Fridolin Ambongo, Arcebispo de Kinshasa (RDC) e Presidente do Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar (SECAM); do Cardeal Antoine Kambanda, Arcebispo de Kigali (Ruanda); de Gabriel Sayaogo, Arcebispo de Koupéla (Burkina Faso); e de Inácio Saúre, Arcebispo de Nampula (Moçambique). Juntamente com os bispos africanos, esteve também presente o professor ruandês Jean Paul Niyigena, secretário da Fundação Internacional Religiões e Sociedades e consultor do Dicastério para a Cultura e a Educação.
Fonte (Vatican News)
Estamos reproduzindo um artigo do site Vatican news.
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