“Pela sua índole escatológica, a Igreja não apenas apresenta ao mundo o Reino de Deus como meta final a toda humanidade, mas ela já o faz presente nas suas instituições e obras. Essa esperança, como pano de fundo na compreensão da teologia do sétimo capítulo da Lumen gentium, ajudou a encontrar mais facilmente o sentido da índole escatológica da Igreja.”
Jackson Erpen – Cidade do Vaticano
O Catecismo da Igreja Católica (CIC), no número 671, afirma que “já presente na sua Igreja, o Reino de Cristo, contudo, ainda não está acabado «em poder e glória» (Lc 21, 27) pela vinda do Rei à terra. Este Reino ainda é atacado pelos poderes do mal, embora estes já tenham sido radicalmente vencidos pela Páscoa de Cristo. Até que tudo Lhe tenha sido submetido, «enquanto não se estabelecem os novos céus e a nova terra, em que habita a justiça, a Igreja peregrina, nos seus sacramentos e nas suas instituições, que pertencem à presente ordem temporal, leva a imagem passageira deste mundo e vive no meio das criaturas que gemem e sofrem as dores do parto, esperando a manifestação dos filhos de Deus». Por este motivo, os cristãos oram, sobretudo na Eucaristia, para que se apresse o regresso de Cristo, dizendo-Lhe: «Vem, Senhor»”.
Neste Tempo Pascal, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe a reflexão “A esperança da restauração de tudo em Cristo”:
“O Concílio Vaticano II apresenta que a restauração prometida que esperamos já começou em Cristo. “A Igreja, à qual todos somos chamados e na qual por graça de Deus alcançamos a santidade, só na glória celeste alcançará a sua realização acabada, quando vier o tempo da restauração de todas as coisas (cfr. Act. 3,21) e, quando, juntamente com o gênero humano, também o universo inteiro, que ao homem está intimamente ligado e por ele atinge o seu fim, for perfeitamente restaurado em Cristo (cfr. Ef, 1,10; Col. 1,20; 2 Ped. 3, 10-13)” (LG,48).
Pela sua índole escatológica, a Igreja não apenas apresenta ao mundo o Reino de Deus como meta final a toda humanidade, mas ela já o faz presente nas suas instituições e obras. Essa esperança, como pano de fundo na compreensão da teologia do sétimo capítulo da Lumen gentium, ajudou a encontrar mais facilmente o sentido da índole escatológica da Igreja. É importante salientar que a teologia do Concílio Vaticano II valorizou muito a presença cristã no mundo, clamando a corresponsabilidade do cristão diante da vida, dos valores da dignidade, do respeito e da fraternidade entre os seres humanos. Os bispos, neste sentido, salientam acerca da seriedade da vida cristã ao dizer assim na Lumen gentium, número 48: “A prometida restauração, que esperamos, começou já em Cristo, foi impulsionada com a vinda do Espírito Santo, e continua por meio dele na Igreja, que nos faz descobrir na fé o sentido da própria vida temporal, à medida que vamos realizando, com esperança nos bens futuros, a obra que o Pai nos confiou no mundo e vamos operando nossa salvação (cf. Fl 2,12)”.
E continua o documento sobre a Identidade da Igreja: “Já chegou, pois, a nós, a plenitude dos tempos (cf. 1 Cor 10,11), a restauração do mundo foi já realizada irrevogavelmente e, de certo modo, encontra-se já antecipada neste mundo: com efeito, ainda aqui na terra, a Igreja está aureolada de verdadeira, embora imperfeita, santidade. Enquanto não se estabelecem os novos céus e a nova terra em que habita a justiça (cf. 2 Ped 3,13), a Igreja peregrina, nos seus sacramentos e nas suas instituições, que pertencem à presente ordem temporal, leva a imagem passageira deste mundo e vive no meio das criaturas que gemem e sofrem as dores de parto, esperando a manifestação dos filhos de Deus (cf. Rom 8,19-22)”.
O cristão é alguém que sabe da sua condição divina, tem consciência de que sua pátria não é aqui e que vive neste mundo como estrangeiro; mas, ao mesmo tempo, carrega uma responsabilidade diante do mundo, pois, como cristão, recebeu uma missão, confiada por Deus, de transformar as estruturas deste mundo pela obra da salvação. É dessa estrutura de esperança que se forja a matéria do Reino, que o homem faz produzir, como fruto de seu comprometimento histórico. O Reino vivido vincula essa história atual com toda a economia da Salvação. Assim, o Reino acontece na Igreja e está inserido na história, história da salvação que possui sua unidade em Cristo. Desta forma, compreende-se que a salvação é sempre uma realidade que engloba um desenvolvimento constante em vista da plenitude do Reino[1].
Raul Gabás, no comentário da Constituição sobre a Igreja, nas célebres edições da Biblioteca de Autores Cristãos, comenta assim, falando da responsabilidade da Igreja no mundo: “Na Igreja, somos instruídos também sobre o sentido de nossa vida temporal, ao mesmo tempo com a esperança dos bens futuros levamos a cabo a obra que o Pai nos tem confiado no mundo e buscamos nossa salvação. A escatologia não se reduz a um futuro mais distante, mas que projeta a sua luz sobre a realidade temporal e ilumina o sentido da existência no tempo. Nossa vida terrena está em perfeita continuidade com a celestial. E se a existência escatológica consiste na convivência amorosa dos homens em Cristo, a vida terrena do cristão tem de conduzir à verdadeira realização do amor humano”[2]. E continua o mesmo autor: “O Concílio tem, um conceito muito alto da existência cristã na terra, Pensa, sem dúvida, que os cristãos elevam uma existência cósmica, experimentando a presença de Deus em todas as coisa e referindo cada parcela da realidade à unidade total no Uno”[3].”
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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[1] Cf. RATZINGER, J. Escatología: La Muerte y la vida eterna. Tomo IX, Curso de Teologia Dogmática, Barcelona: HERDER, 1984, pp. 37-46.
[2] GABÁS, Raul. Indole Escatologica de la Iglesia, in Concilio Vaticano II – I – Constitucion sobre la Iglesia, p.906. Tradução do Espanhol.
[3] Idem, 907.